Entenda o que realmente está em jogo no julgamento que pode ajudar a diferenciar usuários de traficantes
Na tarde desta quinta-feira (17), o Supremo Tribunal Federal (STF) retomará o julgamento que pode levar à descriminalização da posse e porte de pequenas quantidades de drogas – especialmente da maconha – deixando de punir pessoas que forem consideradas usuárias.
Nos votos, alguns ministros estão opinando apenas a respeito da maconha, enquanto o relator da matéria, Gilmar Mendes, apresentou voto favorável à liberação de pequenas quantidades de qualquer substância considerada ilícita.
Até o momento, quatro dos 11 ministros e ministras já votaram, todos a favor da descriminalização. Como a decisão se dá por meio da formação de maioria simples, caso haja mais dois votos favoráveis, a descriminalização será consumada.
Os ministros André Mendonça, Kassio Nunes Marques, Luiz Fux, Dias Toffoli, e Cristiano Zanin ainda não apresentaram seus votos. O mesmo vale para as ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber.
O julgamento começou em 2015, por meio de uma ação que questiona a Suprema Corte sobre a constitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas (Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006) , que tornou crime “adquirir, guardar, ter em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”.
A ação em questão foi movida pelo ex-detento Francisco Benedito de Souza que foi condenado à prestação de serviços gratuitos por 2 meses, com recurso em liberdade, após admitir que portava 3g de maconha, flagradas pelos agentes penitenciários, para consumo próprio.
Mesmo diante do apelo do defensor público, alegando que consumo não é crime, o Ministério Público e o Colégio Recursal do Juizado Especial Cível negaram o recurso, fazendo com que o tema chegasse ao Supremo Tribunal Federal.
Agora, os ministros do Supremo devem responder, em seus votos, se o usuário de drogas afeta ou não outras pessoas com sua conduta. Se sim, deverá ser punido em nome da saúde pública e do bem coletivo, como defendem as pessoas que acreditam que os usuários alimentam o tráfico. Se não, usuários deixam de ser criminalizados, pela tese de que a vida privada não pode ser invadida pelo Estado, logo não é possível criminalizar o consumo.
O tráfico de drogas continuará criminalizado, independentemente da decisão que a Suprema Corte tomar, visto que esse julgamento não trata da venda de entorpecentes. Pelo contrário, um dos pontos centrais do debate é exatamente a diferenciação entre os usuários – que podem deixar de sofrer punições – e os traficantes, que seguirão sujeitos a penas de 5 a 20 anos, além de multa, de acordo com o art. 33 da Lei nº 11.343/06.
Em seus votos, alguns dos ministros estão, inclusive, sugerindo que seja definida uma quantidade “x” de gramas para que essa distinção seja feita, aliada a outros fatores circunstanciais, como a presença ou ausência de elementos como de balanças, dinheiro e cadernos de anotações nos flagrantes, que podem ser indícios de tráfico.
“A maioria dos casos é assim. Quantidade muito baixa, sempre em locais pobres, pessoas jovens, geralmente primárias. Daria para fixar a pena de 1 ano a 8 meses. A gente está enxugando gelo”, diz o defensor público Leandro de Castro Gomes, advogado que apresentou o recurso de Francisco Benedito ao STF.
Um dos ministros que segue esse mesmo entendimento é Alexandre de Moraes, que foi o último a votar no julgamento , posicionando-se a favor da descriminalização da maconha em pequenas quantidades, frisando diversas vezes que a legislação atual, em vigor desde 2006, gerou uma explosão da população carcerária do Brasil, prendendo majoritariamente jovens negros que não representavam nenhum perigo à sociedade.