Quando As Tartarugas Ninja: Caos Mutante confirmou a dupla Trent Reznor e Atticus Ross como compositores da sua trilha sonora, na San Diego Comic-Con, a combinação imediatamente entrou para a lista de rolês mais aleatórios de 2023. Músicos do Nine Inch Nails, banda conhecida por sons sombrios e letras ousadas, os dois fizeram nome no cinema compondo peças climáticas para os filmes de David Fincher (inclusive vencendo o Oscar por A Rede Social), e era difícil imaginar como isso funcionaria dentro de uma franquia que – ao menos, na maioria das suas versões – não é exatamente conhecida pelo tom sério e a tensão sustentada que caracteriza o trabalho de Reznor e Ross. Pois olha só: quem duvidou dessa mistura deve queimar a língua ao assistir a Caos Mutante.
Primeiro, vale notar que os sintetizadores graves e ásperos que viraram a marca da dupla de compositores servem muito bem para apoiar uma missão importante dos cineastas responsáveis por Caos Mutante: a de recuperar a credibilidade da franquia Tartarugas Ninja dentro da cultura urbana nova-iorquina. Skate, grafite, hip hop, pizza de pepperoni – moradores do esgoto, Leonardo, Rafael, Donatello e Michelangelo são, talvez empatados com o Homem-Aranha, os super-heróis mais emblemáticos da Nova York proletária, multicultural, suja (mas encantadora) que vive no imaginário do mundo todo. E o que caracteriza melhor o espaço urbano, afinal, do que a música?
Não que Reznor e Ross sejam os únicos responsáveis por levantar essa bola dentro do filme. O trabalho do diretor Jeff Rowe (A Família Mitchell e a Revolta das Máquinas), ao lado do designer de produção Yashar Kassai (que faz sua estreia no cargo, mas já trabalhou no departamento de arte de Homem-Aranha no Aranhaverso e Festa no Céu), é utilizar o espaço de hiperestilização que Aranhaverso abriu para criar um estilo único de animação, que valorize os apelos preternaturais da franquia. Por isso a decisão de deixar à mostra os rabiscos que normalmente caracterizam os primeiros rascunhos de uma animação, especialmente nos cenários, evocando um desenho rápido na beira do caderno escolar de um adolescente, por exemplo.
É claramente importante, para Caos Mutante, sentir que está conversando propriamente com o público jovem. O roteiro, desenvolvido pelo diretor Rowe ao lado de um quarteto que inclui Seth Rogen e Evan Goldberg (The Boys), além de Dan Hernandez e Benji Samit (Detetive Pikachu), escolhe deixar a construção mitológica do universo da franquia em segundo plano diante das aspirações adolescentes dos protagonistas. Não é que o filme deixe de introduzir uma multidão de personagens, ou negligencie a criação de uma instituição vilanesca envolta em sombras e mistério. Até cena pós-créditos para sugerir os rumos da continuação nós temos – mas esse não é o ponto da história que o filme está escolhendo contar.
fonte. Omelete